quinta-feira, 18 de março de 2010

Compromisso

Na saída da audiência, não escondia o desgosto, indagando por quanto tempo ficaria no prejuízo, sem corrigir sua ficha no bolsa família, que precisava tanto dele, e para confortá-la disse apenas "vamos apelar," sabendo que seriam meses, ou mais disso, até a corte finalmente ver a razão que lhe assistia, num caso simples de entender e resolver, eis que uma filha nascera em 94 e um filho em 95, mas nos assentamentos os dois estavam nascidos em 95, com uma diferença de apenas 19 dias entre os partos normais, uma situação esdrúxula para a qual sua excelência mais uma vez não adotara o menor empenho em entender, mesmo após ouvir a mãe declinar sem tropeço a ordem de chegada de seus seis rebentos, separando os nomes com as respectivas datas de nascimento. Da roça, do coco, da lida sem muito haver, reclamava um corretivo no registro da filha para pôr a jeito seu cadastro com o governo federal e receber o amparo de todo mês, mas aquela negativa não parecia falta de saber, senão de compromisso com a jurisdição para essas realidades da sobrevivência nas quais tropeçamos todo dia, tanto que, enquanto se afastava arrastando passos inconformados, murmurava um "só não sei como botam pra julgar quem não conhece a vida". Pelo menos duas vezes retornou para saber como estava o caso no tribunal, que só depois de 657 dias lhe deu um acórdão favorável.

2 comentários:

sandro bíscaro disse...

Caro amigo e colega Juarez,
somente com essa coragem de denunciar essas coisas, poderemos ter esperança de que algo mudará um dia em nosso Estado.
Claro que custa inúmeras pechas, dentre elas a tal "antiética", cujo sentido foi tão deformado pelos antiéticos que acabou tomando sentido contrário.
Abraço.
Sandro

Rodrigo Bastos Raposo disse...


para quem o prazer de viver é interrompido semanalmente pela obrigação de dar soluções a problemas insignificantes, deve ser difícil mesmo dar soluções a questiúnculas de tostões.
não fosse isso obrigação.
não fosse o direito relevante para quem o pleiteia.