sábado, 2 de abril de 2011

Do poço e outros


Do colega José Osmar Alves, promotor de justiça de São Luís:

"Quando penso que finalmente chegamos ao fundo do poço, o limpador me grita que ainda tem lama para ser retirada.

É o que nos diz a representação dirigida ao Conselho Nacional do Ministério Público, no corrente mês de março de 2011, pelos procuradores de justiça José Henrique Marques Moreira e Raimundo Nonato de Carvalho Filho.

Narra a peça denunciatória que a atual Procuradora Geral de Justiça do Maranhão vem concedendo diárias para si própria e para alguns promotores de justiça de forma irregular, e em valores acima do permitido pela lei.

Valendo-se do Ato Regulamentar 016/2008, editado ao arrepio da lei, a atual mandatária estaria concedendo diárias aos colegas promotores, quando estes respondem, em substituição cumulativa, por promotorias de outras comarcas. Às diárias, soma-se a normal gratificação de substituição.

Ocorre que o art. 133 da Lei Complementar 13/91, na sua atual redação de 2004, prevê unicamente a gratificação correspondente a 10% do subsídio do cargo para as substituições cumulativas.

“Art. 133. O membro do Ministério Público que, cumulativamente ao exercício de suas atribuições constitucionais, for designado para exercer as de outro da carreira, em substituição plena, faz jus a 1/10 (um décimo) do subsídio do seu cargo por mês de trabalho”. (Redação da Lei Complementar n. 80, de 15/12/2004).

Os procuradores escreveram: “Inobstante a clareza da nova disciplina jurídica para a questão, posta em lei complementar, a Procuradora Geral de Justiça Maria de Fátima Travassos Cordeiro (...) passou a fazer da concessão de diárias por deslocamento em razão de substituição cumulativa rotina em sua administração”.

A título de amostragem, a representação traz um quadro das diárias concedidas a 25 promotores de justiça no mês de agosto de 2010, num total de 100 diárias, que alcançaram R$ 63.291,79.

Outra irregularidade apontada é a variação dos valores das diárias para deslocamento dentro do Estado, indo de R$ 480,88 para uns a R$ 1.081,98 para outros, quando o art. 130 da Lei Complementar 13/91 estabelece que esses valores devem corresponder a 1/43 (um quarenta e três avos) da remuneração do cargo de quem se desloca, o que hoje corresponde a R$ 506,19 (entrância final), R$ 480,88 (entrância intermediária) e R$ 456,83 (entrância inicial).

A representação denuncia ainda a ausência de interesse público para a concessão de algumas diárias, como as que foram pagas para a própria Procuradora Geral se deslocar a Belo Horizonte, onde recebeu medalha outorgada pelo Governo de Minas Gerais; para viajar a Cartagena (em companhia da Corregedora Geral, que também recebeu diárias), onde ministraram conferências; e para ir à Espanha, onde igualmente ministrou conferência na Universidade de Salamanca.

Todas essas viagens foram custeadas pelo Ministério Público maranhense, sustentando os representantes a ausência de interesse público a justificar o dispêndio, nestes termos: “O interesse do serviço presente nos deslocamentos indenizados com diárias, deve ser sempre coincidente com o chamado interesse geral da coletividade, inspirado pelo princípio da finalidade e que justifica a existência e a atuação do Estado. Assim, como extrair interesse do jurisdicionado (interesse geral) da participação de procuradores e promotores de justiça em seminários ou congressos em que não se debatem questões intimamente ligadas ao múnus do Ministério Público ou à capacitação dos seus membros para tanto?”.

Por fim, um caso emblemático dos tempos atuais do Ministério Público maranhense: os representantes informam ao CNMP que a promotora de justiça Núbia Zeile Pinheiro Gomes foi mandada à cidade de Viana, com diária, para participar de um seminário sobre o plantio de arroz!

Poder-se-ia pensar que essa promotora é titular de alguma promotoria ligada à agricultura, mas não. Vejamos o que os procuradores dizem: “E o deslocamento de uma promotora de justiça ocupando cargo administrativo ligado às atividades de inteligência e informação estratégica (ocupado simultaneamente com o exercício de fato de chefe de gabinete da Procuradora Geral) para participar das discussões em seminário acerca do plantio de arroz – que, coincidentemente, é realizado na cidade natal dessa promotora de justiça, onde tem residência sua família?”.

As ações denunciadas ao CNMP são acompanhadas das provas do quanto alegado: as publicações oficiais do pagamento das diárias e das razões dos deslocamentos.

Os procuradores pedem providências no sentido de serem estancadas as concessões irregulares, bem como a devolução dos excessos pagos e da integralidade das concedidas com base em atos viciados.

E eu que pensei que já tínhamos atingido a pedra do fundo do poço... Com a palavra o Conselho Nacional, mais uma vez!


PAGAMENTO POR SERVIÇO EXTRAORDINÁRIO

Fui convocado para uma reunião, no dia 07/04, em que será discutido o pagamento do serviço extraordinário que nos exigem os plantões da Comarca de São Luís. Este ano eu já fiz um. Começa segunda-feira, às oito horas, terminando na mesma hora da segunda-feira seguinte. Uma semana, das 18h às 8h nos dias úteis e 24h no sábado e no domingo. Tive sorte no meu plantão: apenas um chamado – uma criança do interior do Estado precisava ser internada e não tinha vaga nos hospitais de São Luís. Eu estava já dentro de campo, na AMPEM, para jogar nossa famosa pelada. Era sábado, por volta das 16h. Tirei o colete e me desloquei para o Fórum. Resolvi tudo com dois telefonemas. Nada de ação judicial. Fiquei meio chateado pelo jogo, mas agora eu tenho os outros 51 finais de semana para jogar, pois neste ano de 2011 não terei mais plantão. Sim, senhores: dá menos de um plantão por ano para cada um dos 84 promotores de São Luís, visto que o ano só tem 52 finais de semana! E ainda queremos pagamento pelo serviço extraordinário... SOU CONTRA! Não é proselitismo, não, é constrangimento mesmo.


DR. FRANCISCO BARROS RECLAMA QUE FUI INJUSTO

O ex-procurador geral de justiça, Dr. Francisco Barros, ligou-me reclamando que eu deveria ter dito no meu artigo, “Cronos Regurgita Seus Filhos”, publicado neste Blog, que, quando de nossa conversa sobre minhas ideias para que não saíssemos do prédio das promotorias da Capital, ele (Francisco Barros) havia me dito que sua decisão de desocupar o edifício estava baseada em recomendação oficial do Departamento de Engenharia da PGJ e em exposição de motivos da Direção das Promotorias, esta, respaldada na opinião de vários promotores da Capital.

É verdade. De fato, após ouvir-me, o Dr. Francisco Barros falou da posição da Engenharia e da petição desse grupo de promotores. E mais: disse-me que a empresa que ganhara a licitação informara que o barulho da reforma seria muito grande e que haveria desligamento da energia, sendo a desocupação do prédio o mais indicado. Eu não relatei esses detalhes de nossa conversa porque não era esse o objeto do meu artigo, e também porque as razões da desocupação do prédio são conhecidas de todos: recomendação técnica dos engenheiros. Além do mais, o colega Celso Coutinho já tinha justificado a evacuação. De modo que a decisão do Dr. Francisco Barros de não atender os meus apelos – conquanto pense eu não ter sido a mais acertada -, do ponto de vista estritamente legal, se acha respaldada. No artigo eu apenas especulo sobre diferentes estilos de condução de um órgão público, e se agora volto ao tema é tão somente para fazer a justiça que me reclama aquele que foi por mim diretamente citado.

Com um abraço fraterno.
José Osmar Alves"

2 comentários:

Celso Coutinho, filho disse...


Somente pelo amor à exata compreensão das ideias, dirijo-me ao colega Osmar, mais uma vez, dizendo-lhe que debater colocando palavras na boca dos outros, perdoem-me o prosaísmo, além de reprovável, demonstra insegurança e tibieza quanto à correção daquilo que se defende. Onde justifico a interdição do prédio das Promotorias da Capital? Em lugar nenhum. É fácil saber, bastando, para tanto, ler o que já escrevi. O que disse, e continuo dizendo, é que, para mim, há uma incongruência no laudo do IBAPE, repetida no relatório do TCE, que requer maior esclarecimento aos leigos, qual seja: se não havia risco de desabamento iminente por que a urgência para a recuperação do prédio; e, se não havia risco de desabamento iminente, havia risco de desabamento?

Em nada adentro, meritoriamente, na questão da desocupação do prédio. Não tenho elementos suficientes para isso. Ou temos um dado sobre o qual não exista dúvida e que, assim, nos permita apontar o erro do Procurador-Geral de Justiça, ou temos que confiar nos seus atos. Volto a repetir sempre que for preciso que é detestável a prática, seja consciente ou não, de nos separarem entre anjos e demônios. Opróbrio típico das tiranias. É inaceitável sair disparando acusações que não se poderá mantê-las de pé adiante. Nesses casos, não basta só um tapinha nas costas, acompanhado de um pedido de desculpas. Somos promotores de justiça e, não, promotores de justiçamento. Do gênio de Rui Barbosa extrai-se a esplendorosa lição de que a lei que não protege o meu inimigo, também não me protege.

Não sou engenheiro, nem tenho os elevados conhecimentos do colega, para afirmar se havia, ou não, risco de desabamento, seja iminente ou não. Tanto que deixo expresso, naquele texto, que, quanto a isso, a perícia tem a palavra, o que, parece, está prestes a ocorrer. Respeito sua opinião de que não havia esse risco, mas não concordo que se possa ter essa certeza, se não for apoiada em um laudo técnico de engenharia. É o que penso. Só isso, nada além. Quem fechou questão não fui eu.

Para ratificar minha “ratada homérica”, como você denominou aquilo que sustentei a respeito, você contou-nos o relato de sua conversa com o Procurador Geral de Justiça à época. Em resposta, me manifestei que compreendo, perfeitamente, a decisão do Dr. Francisco Barros, diante de sua responsabilidade com a integridade física de todos que ali transitavam, e compreendo muito mais agora com esses esclarecimentos que o colega nos presta. Mas, ainda assim, continuou a pensar que, embora legal, a interdição do prédio não foi a medida mais acertada, mesmo com a recomendação técnica dos engenheiros e diante da petição de promotores no mesmo sentido. Completa dizendo que apenas especulou sobre diferentes estilos de condução de um órgão público. Isso que me deixou sem entender.

Celso Coutinho, filho disse...


continuação do comentário de Celso Coutinho, filho

Desculpe, mas essa especulação de diferentes estilos de condução de órgão público, ilustrada na sua conversa com o Dr. Francisco Barros, me fez lembrar da personagem Américo “Treme Treme”, o reformador do mundo, aquele do livro Fábulas, de Monteiro Lobato. Foi-lhe preciso uma jabuticaba cair na cabeça; só, então, despertou para os riscos de suas lucubrações que o levavam a ver erros em tudo que há no mundo. No caso em debate, não tinha jabuticaba para cair na cabeça de ninguém, mas, sim, pedaços de concreto ou coisa que o valha.

Mas, caro Osmar, gosto do debate. Só acho que deveríamos ser mais propositivos. Isto, sim, é novo. Fazer política, sobretudo a institucional, só com acusações é marca do atraso e do provincianismo. Apontar erros é um dever, com a cautela de que se falou acima. Todavia, mais importante, ainda, é expor o que pode ser feito concretamente para melhorar o Ministério Público, divergindo positivamente e, não, para nos dividir entre virtuosos e pecadores.

Nesse sentido, deixemos Homero e Lobato um pouco para lá, e atentemos para uma questão importantíssima que está à nossa volta e que exige, também, que a ela nos dediquemos. Estamos com a elaboração do planejamento estratégico - 2012-2016 - batendo às portas, tanto o do Ministério Público do Maranhão, quanto o do CNMP. Não podemos perder essa oportunidade de ouro para se debater o Ministério Público, especialmente o deste Estado. O primeiro planejamento foi uma rica experiência. Temos, contudo, a chance de dar-lhe, agora, uma feição mais realista, sem querermos sair resolvendo todos os problemas do mundo ao mesmo tempo. É preciso, neste planejamento estratégico, nos incluirmos nele e priorizar o aprimoramento institucional sob a luz das condições de trabalho das unidades executoras, ou seja, das Promotorias de Justiça. Em outra oportunidade volto a esse tema.

Um abraço ao colega Osmar e a todos os demais membros do MP do Maranhão.