[Colaboração do colega Gladston, da Promotoria da Capital]
MINISTÉRIO PÚBLICO: RECONHECIMENTO E REFLEXÃO.
É tempo de festa. De debut. A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei 8.625, de 12 de fevereiro de 1993) completa 15 anos. Além de comemorações, o momento é, também, de reflexão.
Com origem controvertida (Magiaí no antigo Egito, Éforos, em Esparta, Advocati Fisci, em Roma, Saions, na Idade Média, Missi Dominici, na Gália, Vindex, no Direito Canônico, etc), certo é que o Ministério Público nasceu. Seu berço: a França.
Lá, as Ordenações de 25 de março de 1302, de Philippe, o Belo, foram a primeira norma a fazer referência ao Ministério Público. Os Procuradores do Rei (Advocat et Procureur du Roi ou Lens Gens du Roi) denunciavam os infratores da lei e executavam as sentenças judiciais, garantindo o capital da Coroa.
Daí a expressão Parquet, que significa assoalho, ajuntamento de tábuas. O Ministério Público, através dos Procuradores do Rei postulavam aos Juízes, de pé, sobre o assoalho. Por isso, a utilização Parquet ou Magistratura de Pé (Magistrature debut).
No Brasil, as raízes do Ministério Público repousam no Direito Português. Até a Independência do Brasil, vigiam as Ordenações Afonsinas, onde havia menção aos Procuradores de Justiça, as Manuelinas, com referência aos Procuradores dos Feitos do Rei, da Coroa e da Fazenda e Promotor da Justiça da Casa de Suplicação, e as Filipinas, onde, acanhadamente, revelava-se a figura do Promotor de Justiça.
Em 1.609, conheceu-se a primeira lei que efetivamente previu de forma textual a figura do Promotor de Justiça. Referido diploma regulava a composição do Tribunal da Relação da Bahia.
Após a proclamação da Independência do Brasil, a Constituição de 1824, em seu art. 48, apesar de nenhuma referência fazer ao Ministério Público, destacava a função acusadora do Procurador da Coroa.
O Código de Processo Criminal, de 1832, em seus arts. 34, 38 e 74, atribuiu ao Promotor a condição de propositor da ação penal. Já o Aviso de 16 de janeiro de 1838 conferiu aos Promotores a missão de fiscalizar o cumprimento da lei.
Com a reforma do Código de Processo Criminal do Império (Lei 261, de 3.12.1841), os Promotores seriam nomeados pelo Imperador no Município da Corte e pelos Presidentes de Províncias.
A Lei do Ventre Livre (Lei 2.040, de 28.9.1871), conferiu-nos uma das mais nobres de nossas funções: “protetor dos fracos e indefesos”. No mesmo ano, através da Lei 2.033, regulamentada pelo Decreto 4.824, criou-se o Cargo de Adjunto de Promotor. A essa época, apesar dos avanços, a menção ao Ministério Público ainda era pequena.
Instalada a República e instituído o Governo Provisório, o Brasil conheceu-se através de Campos Sales, considerado o Patrono do Ministério Público do Brasil, então Ministro da Justiça, o Decreto Federal nº 1.030, de 14 de novembro - primeiro diploma legal que, efetivamente, tratou do Ministério Público como Instituição. Dizia ser o Ministério Público, “instituição necessária em toda organização democrática e imposta pelas boas normas da justiça”. De igual forma, o Decreto 848, de 11 de outubro de 1890.
A Constituição Republicana de 1891 não fez menção ao Ministério Público, reservando-se a destacar o critério de escolha do Procurador-Geral da República (art. 58, § 2º e 81, § 1º).
Em 1934, a doutrina aponta a constitucionalização do Ministério Público, enquanto Órgão de cooperação nas atividades governamentais (art. 95).
A Constituição de 1937, editada sob a ditadura Vargas, contemplou, tão-só a figura do Procurador-Geral da República. Nesse período, deu-se a previsão e, em seguida, iniciou-se a fala, espera e corrida pelo quinto constitucional: forma derivada de ingresso na magistratura (arts. 99 e 101).
Em 1946 os membros do Ministério Público alcançaram a estabilidade e se tornaram inamovíveis (arts. 125 a 128).
No Capítulo reservado ao Poder Judiciário, o Ministério Público fez-se presente na Constituição de 24 de janeiro de 1967 (arts. 137 a 139). E quando parecia se afastar do Poder Executivo, eis que volve através da Emenda Constitucional nº 1, de 1969 (arts. 94 a 96), tornando-se apêndice daquele Poder.
Com a Emenda Constitucional nº 07/77, o artigo 96 da Constituição anterior foi acrescido de parágrafo único, com previsão de criação de Lei Complementar para organização do Ministério Público Estadual.
Em 14 de dezembro de 1981 foi editada a Lei Complementar nº 40 – primeira legislação que organizou os Ministérios Públicos dos Estados. Nela, algumas grandes conquistas: o Ministério Público foi considerado instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado; foram consagrados os princípios da unidade, indivisibilidade e a autonomia funcional tornou-se realidade; a autonomia administrativa e financeira foi estabelecida; o Cargo de Procurador-Geral deixou de ser demissível ad nutum pelo Chefe do Executivo, entre outras.
Em junho de 1986, em Curitiba, Promotores e Procuradores de Justiça do Brasil elaboraram propostas de disciplina constitucional do Ministério Público, vez que estava por vir a Carta de 1988. Foi escrita a Carta de Curitiba que submetida a apreciação, foi recepcionada pelo Constituinte originário.
Em seguida, a Constituição Cidadão destacou o Ministério Público enquanto instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, responsável pela defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Sedimentou garantias (unidade, indivisibilidade e independência funcional) e estabeleceu vedações. Assegurou-nos autonomia funcional e administrativa.
Numa perfeita correlação de princípios e valores, eis que surge em 12 de fevereiro de 1993, a Lei nº 8.625, que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Esse o motivo da festa. Essa razão da análise e reflexão.
Foi longa a caminhada. Foram penosas as lutas.
Com as conquistas alcançadas, cabe-nos unir e servir. Mas nos cabe, também, avaliar nossa trilha, os nossos caminhos, os nossos méritos, deméritos e o nosso destino.
Será que não nos é chegada a hora de repensarmos o modelo de atuação do Ministério Público? Será esse o Ministério Público que a sociedade deseja?
Para essa análise é preciso coragem, com vistas ao continuo aperfeiçoamento da nossa Instituição.
É imperioso o esforço mútuo, a fim de que juntos possamos contribuir para a efetivação de uma Justiça Social.
Que combatamos fervorosamente as ilegalidades, enfrentando, de igual forma e com destemor, todas as injustiças. Que lutemos pela realização dos fundamentos e objetivos da República Federativa do Brasil. Que façamos valer os princípios que regem a Administração Pública. Que sejamos espelho para as ações justas e legais. E que as conquistas que produziram o reconhecimento público da Instituição não sejam desperdiçadas, mas, sim, revitalizadas, pois toda luta em prol do fortalecimento do Ministério Público é, também, uma luta em favor da sociedade.
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