Por Celso Coutinho, filho. Promotor de Justiça da Comarca de São Bento-MA
Como é sabido, encontra-se em vigor a
Lei nº 12.850/2013, que tipificou o crime de organização
criminosa. Já começam a aparecer, sobretudo na esfera doutrinária,
estudos que procuram estabelecer diferenças entre esse referido
crime e o tipificado no art. 288 do Código Penal, agora chamado de
crime de associação criminosa.
Preocupa-me um entendimento que, não
me espantará, pode ganhar força na comunidade jurídica e ter
pronta receptividade do Poder Judiciário. Reporto-me ao entendimento
pelo qual o crime do art. 288 do CP, a partir da Lei nº 12.850/2013,
passa a referir-se, somente, às infrações penais cujas penas
máximas sejam inferiores a 4 (quatro) anos. Trata-se, a meu ver, de
mais uma mirabolante acrobacia hermenêutica para beneficiar
criminosos neste país.
Estou de acordo que, realmente, com o
advento da Lei nº 12.850/2013, passou a existir, uma diferença
conceitual entre organização criminosa e associação criminosa. No
entanto, não posso concordar que a referida Lei tenha, tacitamente,
descriminalizado a associação para cometimento de crimes cujas
penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos. Pensar o contrário
não traz dilemas apenas de ordem jurídica, mas, também, lógica e
social.
Em meu entendimento, a diferença entre
organização criminosa e associação criminosa está, estritamente,
no modo de constituição do grupo criminoso, no grau de requinte na
formação da quadrilha ou bando.
Pela combinação do art. 1º, § 1º, com
o art. 2º, § 3º, da Lei nº 12.850/2013, tem-se
que a organização criminosa exige o agrupamento de, pelo
menos, quatro pessoas, estruturalmente ordenado e caracterizado pela
divisão de tarefas, ainda que informalmente, sob um comando
individual ou coletivo, com o fim de cometimento de infrações
penais que tenham penas máximas superiores a 4 (quatro) anos.
A associação criminosa (art. 288 do
CP) é menos sofisticada, bastando três pessoas, não exigindo
estrutura ordenada, nem divisão de tarefas, como também prescinde
de um líder.
Na organização, deve haver o objetivo
de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza,
mediante a prática de infrações penais com penas máximas
superiores a 4 (quatro) anos. Na associação, a reunião de pessoas
para o cometimento de infrações não exige o objetivo de obtenção
de uma vantagem, podendo ocorrer com o simples fim de emulação,
perversidade etc.
A triunfar o entendimento de que o art.
288 do CP traz, nesse tipo penal, o elemento objetivo implícito do
cometimento de crimes cujas penas máximas sejam inferiores a 4
(quatro) anos, estaremos diante de uma teratologia jurídica,
porquanto a associação para cometimento de crimes mais graves deixa
de ser apenada, enquanto a associação para o cometimento de crimes
menos graves fica passível de reprimenda penal. Mais
especificamente, somente para ilustrar, três ou mais pessoas que se
associarem para cometerem lesões corporais simples responderão pelo
crime de associação criminosa, enquanto três ou mais pessoas que
se associarem (não é se organizarem) para cometerem homicídios
ficarão isentos dessa imputação.
É preciso reagir a mais essa
travessura hermenêutica para facilitar a vida de criminosos neste
país, tão ao gosto de nossos incautos - e outros traquinos -
garantistas jabuticabas.