Da colega Themis Maria Pacheco de Carvalho, procuradora de justiça, em parecer no Mandado de Segurança 004038-2011:
"[...] não é preciso esforço interpretativo para enquadrar a situação dos presos da carceragem da 1ª Delegacia de Polícia de Bacabal como uma espécie de tortura institucional.
Com base em tais premissas, com todas as vênias, discordo do fundamento utilizado pelo ilustre Desembargador Relator para deferir o pedido de medida liminar nos autos da presente ação mandamental, de acordo com o qual a autoridade coatora teria invadido competência discricionária da Administração Pública ao editar a portaria nº. 003/2010.
É que, como já mencionado, a observância dos direitos fundamentais (dentre deles a vedação de penas cruéis e o respeito a integridade física e moral do preso) é uma exigência direcionada para todos os poderes constituídos – Legislativo, Executivo e Judiciário – uma vez que nenhum destes se confunde com o poder que institui os direitos fundamentais, que lhe é reconhecidamente superior.
Historicamente, a partir do fortalecimento do Estado de Direito, cabe ao Poder Judiciário a tarefa de defender direitos violados ou ameaçados de violência, sendo prerrogativa sua o controle dos atos dos demais poderes, dando concreção ao sistema dos freios e contrapesos (checks and balances) previsto no art.2º da Constituição Federal.
Esse o contexto, já adiantando a conclusão deste parecer, estou convicta que agiu corretamente o MM. Juiz de Direito da 1ª Vara da Comarca de Bacabal ao editar o ato ora impugnado, inexistindo qualquer invasão do Poder Judiciário em área de competência da Administração Pública, eis que o dever de respeito à dignidade humana, à integridade física e moral do preso e a vedação de penas cruéis não caracterizam hipóteses de atuação discricionária do Poder Público, mas, em verdade, materializam deveres de índole constitucional.
[…]
Impressiona a negligência do Estado do Maranhão com relação ao recorrente problema da carceragem da 1ª Delegacia de Polícia de Bacabal, uma vez que este já fora objeto de interdição outras vezes pelos mesmos motivos. Na exordial da presente ação mandamental não consta uma linha sequer – não considero um processo de licitação idôneo para tanto – sobre medidas concretas visando, pelo menos, minimizar o sofrimento dos detentos.
A leniência da Administração Pública em buscar soluções para o problema da superpopulação carcerária não pode ser salvaguardada pelo Poder Judiciário. Ninguém ignora que a solução para tal questão, em virtude da sua complexidade, não ocorrerá da noite para o dia. Contudo, no caso específico da Delegacia de Bacabal, há anos o problema vem sendo reiteradamente noticiado, sem que nenhuma medida concreta tenha sido efetivada.
Por fim, é necessário refletir sobre passagem provocativa de Nilo Batista a respeito da inoperância do Estado no cumprimento de suas obrigações, vejamos:
“Difícil é cobrar do Estado respeito à lei e a proteção dos direitos que toda pessoa tem, a começar pela vida. Perto da culpa do Estado, a do bandido é pequena. E o bandido, a gente consegue prender, processar, julgar e condenar. E o Estado?” (Nilo Batista, Punidos e Mal Pagos: violência, justiça, segurança pública e direitos humanos no Brasil de Hoje, editora Revan, p. 159, grifos nossos)."
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