"A construção de uma verdadeira cidadania deriva da vontade dos atores sociais. Neste sentido, o Ministério Público deve assumir com pioneirismo seu papel de agente de transformação social."
De Joaquim Ribeiro de Souza Junior, promotor de justiça em Santa Luzia. Confira, abaixo, o texto integral: "Portal da Transparência – a verdadeira efetivação do controle social da administração pública."
Sabe-se, dentre os princípios reitores da Administração Pública previstos expressamente no artigo 37, caput, da Constituição Federal, encontra-se o princípio da publicidade que, por sua vez, possui dupla acepção, quais sejam: exigência de publicação dos atos administrativos em sentido amplo e exigência de transparência na atuação administrativa.
De Joaquim Ribeiro de Souza Junior, promotor de justiça em Santa Luzia. Confira, abaixo, o texto integral: "Portal da Transparência – a verdadeira efetivação do controle social da administração pública."
Sabe-se, dentre os princípios reitores da Administração Pública previstos expressamente no artigo 37, caput, da Constituição Federal, encontra-se o princípio da publicidade que, por sua vez, possui dupla acepção, quais sejam: exigência de publicação dos atos administrativos em sentido amplo e exigência de transparência na atuação administrativa.
Quando se fala em exigência de publicação em órgão oficial como requisito de eficácia dos atos administrativos que devam produzir efeitos externos ou que impliquem ônus para o patrimônio público, a publicidade está ligada não à validade, mas à eficácia. Isto quer dizer que, enquanto não publicado, o ato não produzirá qualquer efeito juridicamente válido.
Porém, numa segunda acepção, derivada do princípio da indisponibilidade do interesse público, a publicidade significa exigência de transparência da atuação administrativa.
Percebe-se, portanto, o claro intuito do Poder Constituinte originário de possibilitar, da forma mais ampla possível, o controle da Administração Pública pelos administrados. Alguns dispositivos da Constituição Federal deixam latente esta preocupação de concretizar um verdadeiro Estado republicano. Basta citarmos o art. 5º, XXXIII (direito de informação) e XXXIV, “a” e “b” (direito de petição e de certidões, respectivamente), dentre outros.
Nesta busca por transparência, a Lei Complementar nº 101 (Lei de Responsabilidade Fiscal) atendendo comando constitucional de assemelhada redação, dispõe que as contas apresentadas pelo Chefe do Poder Executivo ficarão disponíveis, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no órgão técnico responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciação pelos cidadãos e instituições da sociedade.
Sem dúvida, tal comando normativo, se devidamente concretizado na prática, é um grande avanço em termos de controle popular da Administração Pública. No entanto, ainda não é suficiente.
Com honrosas exceções, na grande maioria das vezes, os gestores públicos, de um modo geral e, em especial, prefeitos municipais, gastam dinheiro público como bem lhes interessa e contratam profissionais da contabilidade de ética duvidosa, geralmente sem licitação, para “montar” a prestação de contas anuais apresentadas ao Tribunal de Contas, bem como o relatório de gestão fiscal e o relatório resumido da execução orçamentária. Para tanto, utilizam notas fiscais falsas, dentre outros expedientes escusos e fraudulentos.
Portanto, não basta dar publicidade do produto final (prestação de contas anuais). É necessário que a sociedade acompanhe a execução orçamentária durante todo o exercício financeiro, tomando conhecimento imediato de cada receita apurada e de cada despesa ordenada.
Neste sentido, a Lei Complementar 131 revolucionou o conceito de transparência em nosso País. Referido diploma, alterou o artigo 48, parágrafo único, II, acrescentando ainda o artigo 48-A à Lei de Responsabilidade Fiscal.
Referida Lei passou a considerar obrigatória a criação, instalação e regular funcionamento de portais da transparência em todos os Entes Federados, com liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso.
O artigo 48-A da Lei de Responsabilidade Fiscal, estabelece que nesses portais, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso às informações referentes às despesas, incluindo os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado. Em relação às receitas, as entidades federativas deverão disponibilizar o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários.
Verifica-se ictu oculi, o caráter revolucionário e vanguardista que a efetivação dos portais de transparência em todas as entidades federativas causará. Certamente facilitará o trabalho dos órgãos de fiscalização e o controle social da Administração Pública. Imagine, por exemplo, quantas requisições o Ministério Público poderá deixar de enviar para ter acesso a atos administrativos, bastando uma simples consulta ao portal. Mesmo que se decida pelo envio da requisição, o Promotor de Justiça poderá verificar, com facilidade, se as informações prestadas a partir da resposta ao ofício requisitório são ou não compatíveis com os dados disponibilizados no portal.
Já em relação ao controle social, imagine o quão interessante seria a possibilidade de cada cidadão verificar, diariamente e com um simples acesso à internet, sem sair de sua residência ou local de trabalho, o quanto o seu Prefeito, o seu Governador, o seu Presidente e demais ordenadores de despesas gastaram, onde gastaram, para quem pagaram e como foi arrecadado o recurso. É a inauguração de um novo paradigma de Administração Pública, pautada efetivamente na forma de governo republicana, onde o gerente (gestor) deve prestar contas diárias ao patrão (o povo).
Porém, a referida Lei Complementar nº 131, editada em 27 de maio de 2009, estabeleceu prazos diferenciados para o início de vigência de seus comandos, de acordo com o tipo de ente Federado e a população respectiva. Nestes termos, União, Estados, Distrito Federal e Municípios com população acima de 100.000 (cem mil habitantes) teriam 1 (um) ano para criar e instalar seus respectivos portais da transparência, prazo este já expirado desde 27 de maio de 2010. Já os Municípios com população entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes, teriam 2 (dois) anos, prazo que também já expirou em 27 de maio de 2011. Os Municípios que tenham população de até 50.000 (cinquenta mil habitantes) só estariam obrigados à criação do portal, após 4 (quatro) anos, ou seja, apenas em 27 de maio de 2013.
Analisando as circunstâncias do nosso Estado do Maranhão, percebe-se que o Governo do Estado e todos os municípios com população superior a 50.000 (cinquenta mil) habitantes já estariam obrigados a criar o portal e mantê-lo atualizado em tempo real à realização de toda e qualquer despesa ou receita. Neste rol estariam municípios como Imperatriz, Santa Luzia, Santa Inês, Grajaú, Balsas, Caxias, Timom, Barreirinhas, Codó, Bacabal, Açailândia, Presidente Dutra, dentre outros. Imaginem se todos contassem com seu respectivo portal da transparência? No mínimo estaríamos dificultando atos de corrupção e fortalecendo a cidadania em nosso Estado.
Infelizmente, ainda não estaríamos solucionando instantaneamente todos os graves problemas sociais que nos afligem, mas estaríamos dando um grandioso passo. É certo que, o nível de consciência política, ética e até ecológica da sociedade determinará o maior ou menor grau de benefícios que os portais da transparência trarão. A construção de uma verdadeira cidadania deriva da vontade dos atores sociais. Neste sentido, o Ministério Público deve assumir com pioneirismo seu papel de agente de transformação social.
Não temos o direito de desanimar, em razão da resistência certa que enfrentaremos quando decidirmos efetivar o comando legal. Todos nós sabemos que ser Promotor de Justiça é muito mais do que exercer uma profissão, é um estado de espírito. A complexidade das funções exige compromissos sociais e serenidade para encará-los, principalmente nas batalhas mais difíceis.
Há alguns anos, o colega Francisco Fernando Menezes Filho, brilhante Promotor de Justiça da Comarca de Pastos Bons, idealizou um programa institucional do Ministério Público do Maranhão denominado Contas na Mão, justamente com a finalidade de exigir transparência por parte dos gestores públicos. A postura do MPMA idealizada pelo referido colega, mas encampada por todos nós, fez com que ganhássemos enorme credibilidade social. Pergunto: por que não aproveitamos a vanguardista legislação acima citada e damos continuidade ao exitoso programa, exigindo a criação e efetivo funcionamento dos portais no Governo do Estado e municípios com população superior a 50.000 (cinquenta mil habitantes) e recomendando aos demais municípios, com população inferior a 50.000 (cinquenta mil habitantes), que se adequem no sentido de cumprir o comando legal assim que estiverem obrigados, ou então que se antecipem e também já criem seus respectivos portais, demonstrando moralidade no trato da coisa pública e respeito ao cidadão? Certamente estaríamos contribuindo enormemente com o fortalecimento da cidadania e inibindo atos de corrupção, antes de consumados. Pedindo licença para plagiar um pouco o colega Fernando, ao qual rendo todas as homenagens, seria uma espécie de Contas na Mão – Parte II. Fica a dica para que a Procuradoria Geral de Justiça e a Associação do Ministério Público do Estado do Maranhão encampem esse desafio. Seria bom para o MP, melhor ainda para sociedade.
É só uma sugestão.