sexta-feira, 22 de agosto de 2008

O Mel


Acabou! Século XXI. O serviço público deixa de ser um negócio familiar. O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante 13, que veda a prática do nepotismo em qualquer dos poderes da União, dos Estados e dos Municípios.


Passaram-se 20 anos, para que se obedecesse a simples leitura da Constituição Federal. Não foi preciso editar nenhuma nova lei para cumprir o que a Constituição 88 sempre disse. Mas, não precisava nem ser jurista, nem brilhante, para saber o que a sociedade há tempos grita: a familiarização do poder, paga com o dinheiro do contribuinte.


Confira o enunciado da Súmula Vinculante nº 13:


“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.”


O Ministério Público do Maranhão já viveu seus dias de glória no mel do nepotismo: maridos, mulheres, filhos, genros, noras e sobrinhos pendurados em gabinetes. Só recuou puxado pelo cambão do CNMP (Resolução 01/05). Depois disso, desde 2006, mergulhou no bom combate para extirpá-lo.



AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 021393/2006 – MIRADOR

Recorrente: Francisco Rodrigues da Silva

Recorrido: Ministério Público Estadual

Processo nº 0231/2006 – Ação Civil Pública


CONTRA-RAZÕES DO AGRAVADO



EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MARANHÃO,

COLENDA 4ª CÂMARA CÍVEL,



01. Desde o ano passado, instaurou-se em nosso País o sadio combate em defesa dos princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade, igualdade e eficiência.


02. De um lado, detentores de poder: governantes, parlamentares, membros do Ministério Público e magistrados, tão longamente acostumados à perversão da coisa pública como instrumento de incúria do erário em favor de sobrinhos, genros, sogros, filhos e cônjuges. Um grupo de cultores do nepotismo, sempre dispostos à generosidade familiar com o dinheiro dos contribuintes.


03. Do outro lado, a sociedade, representada por alguns tantos parlamentares, procuradores, promotores e magistrados, brandindo as letras da Constituição, para tentar modernizar a estrutura de um Estado, que, em pleno século XXI, enreda-se, ainda em práticas coloniais.


04. Nesse combate, o Ministério Público da Comarca de Mirador, em maio de 2006, ajuizou a Ação Civil Pública nº 127/2006, em face do Município de Mirador e, em junho de 2006, a Ação Civil Pública nº 231/2006, em face da Câmara Municipal de Mirador. Ambas obtiveram provimento liminar favorável, no juízo de primeiro grau. Ambas foram alvo de agravos de instrumento, promovidos pelo mesmo escritório de advocacia, fincados nos mesmos argumentos. O primeiro coube à Terceira Câmara Cível, com relatoria do Des. JOSÉ STÉLIO NUNES MUNIZ, que não concedeu efeito suspensivo à decisão guerreada.


05. O outro agravo de instrumento é este. Apesar de no ofício que o encaminhou (Ofício nº 4124/2006-CCC) constar “informo que indeferi o pedido de efeito suspensivo”, a decisão que o acompanha foi em sentido contrário.


06. O agravante, às fls 04, afirma que: “O Representante do Ministério Público Estadual em Mirador, propôs Ação Civil Pública com pedido de liminar fundamentando-se na Resolução nº 07/05 do Conselho Nacional de Justiça



07. Essa assertiva não condiz com a verdade nos autos, visando induzir o julgador a erro. Eis que o agravado, na inicial, cf. às fls. 33/34, foi claro ao explicitar: “as ações civis propostas pelo MP maranhense visando a demissão de parentes do Executivo e do Legislativo Municipal (e futuramente do estadual) não tem por base as resoluções editadas pelos Conselhos Nacionais da Magistratura e do Ministério Público, pois como é claro, tais resoluções são aplicáveis somente aos órgãos do Judiciário e do Ministério Público.”


08. A ação civil pública em face do agravante se baseia nos princípios constitucionais da administração pública, que, salvo mente jurídica menos iluminada, são aplicáveis a todos os poderes: executivo, legislativo e judiciário.


09. Assim, frise-se e refrise-se, para deixar bem esclarecido, extreme de dúvida: o agravado não peticionou o cumprimento de Resolução do CNJ ou do CNMP, por parte do agravante, mas sim o indeclinável respeito à Constituição Federal.


10. “Com efeito, a vedação ao nepotismo, conforme consagrado pela Suprema Corte, decorre diretamente da Constituição Federal, não havendo, destarte, que se falar em ausência de regulamentação específica. A conseqüência é iniludivelmente, sua aplicação ao Executivo, Legislativo, Judiciário. Indefiro a suspensividade requerida.” (Des. Stélio Muniz. Agravo de Instrumento nº 019987/2006. Diário do Poder Judiciário nº 204, de 23/10/2006, fls. 13) [Destaquei]


11. Como dito acima, no País instaurou-se o sadio combate ao nepotismo, que, também, por estes autos, chega à Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão.


12. Pugnamos pela vitória dos princípios constitucionais da administração pública, em detrimento da arcaica familiarização do poder, paga com o suor do contribuinte.


13. Ex positis, para que se releve a Justiça, o Ministério Público crê e espera que Vossas Excelências neguem provimento ao agravo de instrumento, mantendo-se a decisão agravada.


Mirador (MA), Segunda-feira, 15 de Janeiro de 2007.


Juarez Medeiros Filho


Promotor de Justiça



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