sexta-feira, 16 de abril de 2010

Pai

Crianças de todas as plumagens e cantos chilreavam no pátio do singelo jardim de infância, na manhã chuvosa daquele segundo dia do tardio calendário escolar. Algumas nem pareciam novatas; outras, meio trôpegas, escorriam timidamente para os cantos do salão. Quase à hora de formar as turmas, à porta do desalinhado banheiro, um menino, aparentando seis anos, abandonava generosas lágrimas pelas maças do rosto, quase se engasgando em repetidos suspiros. Pensou nas crianças que estranhavam o início do estorvo escolar, ― não parecia o caso ―, mas não arriscava outro palpite, quando se aproximou e o tocou, que não haveria choro sem motivo, e seu remédio seria consolo. Confiava que, algumas palavras amoráveis depois, e estaria correndo, sorrindo e gritando como os demais. Sentou-se à borda do terraço e o pôs no colo, iniciando as conversas do ofício, sem sucesso, pois os suspiros não pareciam dispostos a ceder. Foi arriscando meia dúzia de indagações costumeiras, até, despretensiosamente, esbarrar em “onde está teu pai?”. Desse ponto, gradualmente, foi ouvindo aquela frágil infância revelar, com palavras embebidas em soluços, que o pai estava preso na delegacia, ali bem perto, porque batia em seus irmãos e mais em sua mãe que estava muito doente num hospital em Caxias; que o pai mexera com uma das filhas; que os sete irmãos tinham sido recolhidos no interior e estavam arranchados na casa de um parente, onde o pouco era quase nada para as bocas tantas. E mais disse, debulhando lágrimas, sem entender o que eram cruzes ou espinhos que feriam os olhos de quem tentava consolá-lo. De longe, num canto do pátio, quando os outros petizes já esboçavam silêncio nas salas, o cenário sem moldura era o choro do dia, o choro do infante, o choro da tia.

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