segunda-feira, 22 de junho de 2009

Falsas intimidades

A suspeita é de que considerável número de magistrados, para fugirem de alguns trabalhos mais indigestos, desses que consomem pesadas doses de neurônios, tempo e disposição, ou exigem postura para contrariar interesses, se valiam de dispositivo do Código de Processo Civil para lançar seus abacaxis em cima da mesa de outros colegas.

Ou seja, se o processo apresentava cabelos em profusão, anotavam o parágrafo único do artigo 135 do CPC e se autoproclamando “suspeitos por motivo íntimo” abandonavam o caso.

Nada no céu ou sobre a terra tinha poder para incitar o juiz a declarar qual era esse “motivo íntimo”, que tanto podia ser real, — amizade, inimizade, preconceito, — quanto mero artifício para se livrar de um trambolho. Nesse caso, um perfeito disfarce para a preguiça, ou para exercer a medrosa conveniência de não produzir desagrados.

Isso emerge da justificativa do Conselho Nacional de Justiça para lançar a Resolução nº 82/2009, pois não faria sentido editá-la se todos estivessem atuando conforme as finalidades do instituto.

Presume-se que ela terá vida breve. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) já anunciou que ajustará suas baterias no STF para ver declarada sua inconstitucionalidade. Nada difícil.

E o problema persistirá. Alguns avessos ao trabalho árduo, ou faltos de coragem, continuarão sobrecarregando seus colegas com falsas intimidades.

Veja a resolução:

Resolução nº 82, de 09 de junho de 2009 — Regulamenta as declarações de suspeição por foro íntimo.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições,

Considerando que durante Inspeções realizadas pela Corregedoria Nacional de Justiça foi constatado um elevado número de declarações de suspeição por motivo de foro íntimo;

Considerando que todas as decisões dos órgãos do Poder Judiciário devem ser fundamentadas (art. 93, IX, da CF);

Considerando que é dever do magistrado cumprir com exatidão as disposições legais (art. 35, I, da LC 35/1979), obrigação cuja observância somente pode ser aferida se conhecidas as razões da decisão;

Considerando que no julgamento do relatório da Inspeção realizada no Poder Judiciário Estadual do Amazonas foi aprovada a proposta de edição de Resolução, pelo Conselho Nacional de Justiça, para que as razões da suspeição por motivo íntimo, declarada pelo magistrado de primeiro e de segundo graus, e que não serão mencionadas nos autos, sejam imediatamente remetidas pelo magistrado, em caráter sigiloso, para conhecimento pelo Tribunal ao qual está vinculado;

Considerando que a sistemática de controle é adotada, com êxito, há vários anos, por alguns Tribunais do País.

R E S O L V E:

Art. 1º. No caso de suspeição por motivo íntimo, o magistrado de primeiro grau fará essa afirmação nos autos e, em ofício reservado, imediatamente exporá as razões desse ato à Corregedoria local ou a órgão diverso designado pelo seu Tribunal.

Art. 2º. No caso de suspeição por motivo íntimo, o magistrado de segundo grau fará essa afirmação nos autos e, em ofício reservado, imediatamente exporá as razões desse ato à Corregedoria Nacional de Justiça.

Art. 3º. O órgão destinatário das informações manterá as razões em pasta própria, de forma a que o sigilo seja preservado, sem prejuízo do acesso às afirmações para fins correcionais.

Art. 4º. Esta resolução entrará em vigor na data de sua publicação.

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